Cesária Antunes, Diretora Técnica do Lar Universal, aborda o tema tanto do ponto de vista profissional, como humano…

Folha de Portugal: No seu percurso profissional, já se deparou com muitos casos de violência de filhos contra idosos ou por parte dos familiares em geral?

Cesária Antunes: Já me deparei com alguns casos de violência contra idosos. A violência, no seio familiar, pode-se apresentar sob várias formas. Existe a violência física, mas também a violência psicológica, emocional, verbal. Também existem os casos de negligência em que o idoso não recebe os cuidados básicos de alimentação, higiene e assistência médica de que necessita. Nestes anos de trabalho com idosos, já surgiram alguns casos de violência.

FP: Como é que um profissional da área deverá abordar situações como a referida?

CA: Habitualmente, as questões relacionadas com violência cessam com a entrada do idoso para o Lar. Em contexto institucional, os cuidados passam por proporcionar um ambiente calmo. O convívio com outros idosos e com as diversas equipas de cuidados, a rotina, a boa disposição e os cuidados básicos (alimentação, higiene, conforto, cuidados médicos) que são prestados diariamente transmitem segurança. Amparar o idoso através de apoio psicológico e a estimulação através de atividades de ocupação e lazer são também fatores determinantes para a recuperação emocional. Ao fim de alguns meses, grande parte dos idosos (mesmo aqueles que não foram vítimas de violência) recusam voltar definitivamente para a sua antiga casa ou para a família e assumem a instituição e o seu quarto como “a sua casa”. Na sociedade, sempre que sejam evidentes sinais de maus tratos num idoso, um prossional da área deverá denunciar a situação às entidades competentes.

FP: Na sua opinião, este tipo de violência exercida sobre os idosos deixa marcas psicológicas visíveis?

CA: Sim, claramente. Mesmo que o idoso recuse conversar sobre o que aconteceu, as suas reações comportamentais deixam transparecer nitidamente as marcas deixadas. Algumas pessoas reagem com agressividade extrema em situações de contrariedade ou frustração. O nervosismo e o medo também são reações frequentes. Dependendo do nível de violência que tenha sido praticado e da idade e problemas de saúde presentes no idoso, pode causar alucinações e até danos cerebrais irreparáveis. Outra das marcas deixadas é a depressão, que pode levar ao autoisolamento da pessoa e aos desejos de suicídio.

FP: No Lar Universal, já se deparou com algum idoso que tenha sido vítima de violência no passado e como lidou com esse caso específico?

CA: Por vezes, a violência não é exercida diretamente sobre o idoso. Na sequência de problemas financeiros, de saúde ou outros, acontecem situações de violência no seio familiar, às quais o idoso está exposto continuamente. Começa por sentir-se culpado dos problemas que a família vive, frustrado por não conseguir ajudar e tende a sentir que também é um problema para a família. Numa fase inicial, com o objetivo de “aliviar” os familiares do “peso em que se tornou”, o idoso escolhe viver num Lar. Com o passar do tempo e a adaptação à nova fase da sua vida, o idoso recupera a sua autoestima e, muitas vezes, apoia os seus familiares, transmitindo ânimo.
Alguns dos idosos de hoje não foram vítimas de violência na sua idade avançada, mas foram vítimas na infância e/ou no casamento. Essas situações também deixam marcas ao longo da vida.

FP: É possível prevenir situações como estas na sociedade?

CA: Sim, é possível. Através de leis e campanhas de sensibilização, que despertem a atenção sobre o tema. Assistimos a muitas campanhas de sensibilização sobre diversos assuntos, mas, no que se refere a maus tratos a idosos, o tema ainda é tratado nas suas consequências e não na sua prevenção.

“Aqui tenho mais do que tive a minha vida toda…”

No Lar de Idosos Universal, o processo de admissão do idoso é tratado de uma forma multidisciplinar, tendo em conta as várias facetas do bem-estar e qualidade de vida…

Tendo como objetivo a qualidade de vida do idoso, são consideradas não só a dimensão física, a nível de alimentação e assistência médica e medicamentosa, mas também a dimensão psicológica, social e espiritual. São desenvolvidas atividades que estimulam a mente, por forma a promover um envelhecimento ativo e, dentro do possível, retardar e até impedir o desenvolvimento de vários tipos de demências. A assistência espiritual e a prática da fé contribuem de uma forma decisiva para a autoestima e bemestar psicológico de cada idoso.

AMBIENTE FAMILIAR

Todo o carinho, respeito e atenção dedicados pelas diferentes equipas tornam, o que poderia ser apenas uma ERPI (Estrutura Residencial para Pessoas Idosas), num lar. O aconchego de um sorriso, de um abraço e de uma palavra positiva fazem com que sejamos todos parte de uma família. Muitas vezes ouço comentários e desabafos como: “é o melhor que me poderia ter acontecido”; “aqui tenho mais do que tive a minha vida toda…”; “o meu dinheiro jamais chegaria para os cuidados que tenho”. Assistir à superação diária de tantos obstáculos na vida destes idosos acaba por contagiar com a sua positividade. A todos aqueles que contribuem para que estes cuidados possam ser prestados, a quem já deu tanto de si, o nosso muito obrigada!

Fonte: Universal.org

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